9 de outubro de 2013

 

Painel de Elifas Andreato resgata tortura durante ditadura militar

O artista gráfico Elifas Andreato – que está expondo pinturas em homenagem ao poeta Vinicius de Moraes, em Salvador - assina o painel sobre a tortura na ditadura militar, plantado na Câmara dos Deputados. Chama-se “A Verdade Ainda que Tardia” e está montado no corredor de acesso ao Plenário. A obra fez parte da exposição “Parlamento Mutilado: Deputados Federais Cassados pela Ditadura de 1964”, que homenageou 173 deputados cassados no período, 28 deles ainda vivos.

O painel resgata a história da tortura na ditadura militar. Com 5,5 metros de comprimento e 1,70 m. de altura, o painel levou três meses e meio para ser concluído. O artista, que trabalhou 15 horas por dia, considerou “o tempo curto para uma obra tão grande”. Esse processo foi registrado em um documentário feito pelo próprio autor.
MEMÓRIA E VERDADE - Após participar de encontros que investigaram a Operação Condor, uma aliança político-militar entre o Brasil, Paraguai, Uruguai, Chile, a Argentina e Bolívia, criada com o objetivo de coordenar a repressão a opositores das ditaduras militares desses países, Andreato recebeu a encomenda da Comissão Parlamentar Memória, Verdade e Justiça, criada com o objetivo de investigar violações de direitos humanos por agentes do Estado brasileiro entre os anos 1946 e 1988. O painel é uma doação para a comissão.

Para pintar o painel, Andreato passou a estudar as práticas de tortura. “As revelações foram muito impressionantes para mim. Opondo-me ao regime, eu tinha quase certeza de que conhecia todos os métodos de tortura implantados pela Agência Central de Inteligência [CIA] americana e pelas polícias inglesa e israelense, mas, lendo e ouvindo relatos, descobri que desconhecia coisas aterradoras. Eram suplícios além daquilo que eu podia imaginar”, disse Andreato.
SUPLÍCIO DE CRISTO - Para ilustrar a obra, o artista fez a coroa de Cristo, que perfurava o crânio das pessoas ao ser apertada com um parafuso, em um homem sentado na “cadeira do dragão”, espécie de cadeira elétrica. Outro indivíduo encontra-se crucificado. “Eu fiz questão de ter essa associação com o suplício de Cristo, porque eles tinham isso nesses processos”. O painel ainda traz a inscrição do nome Dodora, codinome de Maria Auxiliadora Lara Barcelos e companheira de cela da presidenta Dilma Rousseff quando esta foi presa pela ditadura. Dodora suicidou-se na Alemanha, na década de 1970.

“Comoveu-me muito a história de Dodora porque ela foi barbaramente espancada e estuprada pelo capitão Guimarães [da Polícia do Exército, da Vila Militar do Rio de Janeiro]”, disse Andreato, que, para retratar o ambiente sujo e ensanguentado, utilizou a cor ocre, uma variação do marrom. “Fiz isso também para dar uma unidade ao painel, que foi pintado em três partes. Ele inteiro não cabe no meu estúdio. Se eu considerar que é um convite da pátria, é uma honra para mim poder retratar a crueldade e a barbárie praticadas por torturadores daquele período”.
CAPA DE LAMARCA – Em 1980, Elifas Andreato criou a capa do livro “Lamarca, o Capitão da Guerrilha”, dos jornalistas baianos Emiliano José e Oldack de Miranda. Agora, já vai recriar a capa para a próxima edição, revisada e atualizada, que os autores trabalham. Elifas Andreato tem sua história de vida ligada à luta contra a ditadura. Em 1972, seu pensamento político materializou-se ao fazer ilustrações para o jornal alternativo Opinião, um semanário político do Rio de Janeiro de oposição ao regime. Em São Paulo, fez o jornal Movimento com a mesma ideia. “Eu tive amigos que sumiram, que foram espancados e fiz o que tinha que fazer”, acrescentou.

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