7 de julho de 2007

 

Santo Amaro está perto de se livrar da herança maldita

Caetano Veloso chegou a cantar que sua Santo Amaro da Purificação iria “mandar os malditos embora”. Demorou. A herança maldita deixada pela Cobrac/Peñarroya – milhares de toneladas de escória de chumbo – será reprocessada pela empresa argentina Bolland, especializada em tratamento de resíduos industriais. Das montanhas de escória a empresa vai reaproveitar os óxidos de ferro, zinco e chumbo para venda ao setor industrial. A Bolland vai investir R$ 20 milhões, gerar 90 empregos e extrair 190 mil toneladas de matérias-primas, em três anos.

Santo Amaro é considerada por organizações ambientais internacionais como a cidade mais poluída por chumbo do mundo. Desde 1960 a metalurgia de chumbo acumulou 500 mil toneladas de escória amontoadas em plena cidade. O minério vinha de Boquira, município do interior da Bahia, transportado em caçambas até Santo Amaro e transformado em lingotes de chumbo.

A indústria funcionou até 1993 quando foi fechada com base nas novas legislações ambientais. O refugo contaminado chegou a servir de reboco para residências, usado para pavimentação urbana e boa parte escorreu para o rio Subaé, indo poluir as águas da Baía de Todos os Santos. Daí Caetano desejar mandar os malditos embora.

É uma vitória do Governo Jaques Wagner (PT).

Segundo informa a Gazeta Mercantil (sexta-feira, 6 e 7 de julho de 2007), todo o processo de escolha da metodologia para o reprocessamento da escória foi coordenado pela Secretaria de Ciência e Tecnologia e Inovação (Secti). O CRA já concedeu a licença ambiental.

A Bolland vai tratar a escória a partir da hidrometalurgia, um processo de tecnologia limpa. A escória será misturada com uma solução de ácido clorídrico e água, para que os metais possam ser dissolvidos. É um sistema fechado onde o material circula até ficar saturado.

Desta vez, o refugo que não for reaproveitado será levado para uma unidade de tratamento de resíduos da Cetrel, no Pólo Petroquímico de Camaçari. Do reprocessamento vai sair o óxido de ferro, usado na fabricação de tintas, o óxido de sinco que tem aplicações industriais e o chumbo metálico, usado na indústria de baterias de veículos.

É uma derrota histórica para o carlismo – leia-se ACM, César Borges e Paulo Souto.

Durante décadas parte da população atingida por doenças vinha se mobilizando por uma intervenção do Estado. Santo Amaro já recebeu visita de parlamentares verdes como Fernando Gabeira e do movimento negro, como Luis Alberto (PT).

Há pouco tempo recebeu uma delegação de jornalistas franceses a convite do ministro Gilberto Gil. Os jornalistas foram acompanhados pelo então deputado estadual da Bahia, jornalista e escritor Emiliano José (PT). Um bom clipping está no site do ex-deputado (www.emilianojose.com.br). Acadêmicos da Universidade Federal da Bahia e de universidades paulistas pesquisam há anos a saúde da população atingida.

Pessoalmente, vi slides de um médico local, documentando as dezenas de casos de crianças nascidas sem cérebro. Visitei casas de trabalhadores aposentados e fui levado à sede da Associação das Vítimas da Contaminação por Chumbo, Cádmio, Mercúrio e Outros Elementos Químicos (Avvica), liderada pelo “d. Quixote de La Mancha”, Adailson Pereira Moura.

Também acompanhei os jornalistas franceses na visita a Santo Amaro. Tivemos que arrebentar os cadeados dos portões para entrar na antiga fábrica, com uma liminar judicial e apoio da Polícia Militar.

É uma lástima que o carlismo tenha lavado as mãos. Muitas vidas teriam sido poupadas. Muito metal pesado teria deixado de contaminar as águas da Baía de Todos os Santos. O saturnismo, o câncer, a leucopenia, que acometem antigos trabalhadores poderiam ter feito menos estrago.

Sexta-feira vou subir a Colina Sagrada, à Igreja do Senhor do Bonfim, agradecer a Oxalá pela vitória de Jaques Wagner e pedir mais sabedoria política para a cúpula sindical que diz representar os professores da Bahia.

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