14 de junho de 2007
TV brasileira condena Chávez para perpetuar-se no poder
O jornalista e professor de comunicação da Unicamp, Carlos Drummond dá uma grande contribuição para o desmascaramento da verdadeira intenção da mídia brasileira ao se solidarizar com a RCTV venezuelana – legalmente cassada pelo presidente Chávez – e se meter tão acintosamente nas questões internas da Venezuela.
Não se trata propriamente de defender a “liberdade de expressão”, já que em muitos países ocorreram e ocorrem decisões de governo que tiram emissoras de TV do ar, sem nenhum protesto. Trata-se, na verdade, de criar um clima para que elas próprias privatizem as concessões, perpetuem-se no controle dos canais, por causa de seus bilionários negócios. Eles não querem pagar impostos, não querem regulamentações, não querem se submeter às leis.
SEGUE A ÍNTEGRA:
Fonte: Revista Terra Magazine do Portal Terra
http://terramagazine.terra.com.br/
TV do Brasil defende venezuelana para perpetuar-se
Carlos Drummond
As emissoras de televisão brasileiras estão aproveitando a “polêmica” em torno da não renovação da concessão da Radio Caracas Televisión - RCTV da Venezuela para criar um clima que inviabilize qualquer questionamento sobre as suas próprias permissões para operar. A idéia subjacente é PERPETUAR as suas licenças, por definição temporárias.
É mais um passo da privatização branca das concessões do Estado para a operação de emissoras, renováveis ou não a cada 15 anos no Brasil. A presença maciça de parlamentares proprietários de emissoras e o interesse generalizado dos políticos de não se indispor com a mídia têm garantido a renovação automática das permissões.
O poder de comunicação decorrente da propriedade de emissoras de televisão assegura a reeleição desses políticos em um esquema de blindagem das concessões que se realimenta a cada pleito.
Pelo menos tão grave e condenável quanto a homogeneização do conteúdo televisivo empreendida pelo governo da Venezuela é a não aceitação, lá e aqui, da decisão legal que impediu a RCTV de continuar no ar. A origem da inquietação dos barões da televisão brasileira é uma decisão legal do maior tribunal de um país estrangeiro.
A Suprema Corte da Venezuela determinou que, ao final do seu período de concessão de 20 anos, no último dia 28 de maio, a RCTV deveria sair do ar, por ter participado do golpe contra o presidente Hugo Chávez em 2002 e por demonstrar falta de respeito para com as autoridades e as instituições venezuelanas.
O ministro das Telecomunicações, Jessé Chacón, disse que se a emissora não saísse do ar, estaria operando na ilegalidade. A decisão formal da corte e a declaração oficial do ministério das Telecomunicações não impediram a RCTV de dizer que a decisão do governo venezuelano de não renovar a sua concessão foi ilegal.
No Brasil, o presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Daniel Slaviero, criticou, em discurso pronunciado no 24º Congresso Brasileiro de Radiodifusão, o fechamento da emissora venezuelana, classificando a decisão da justiça de lá como iniciativa isolada para restringir a liberdade de expressão.
Noticiou-se que Slaviero defendeu também a redução de impostos para a compra de equipamentos para a TV digital e pediu mais linhas de crédito, merecendo, compreensivelmente, aplausos intensos dos participantes do congresso.
O fato de que a liberdade de expressão mencionada é proporcional ao poder econômico e político do cidadão e, portanto, dominada, hoje, pelos donos dos grandes grupos privados de comunicação, passou ao largo das formulações do encontro. Assim como o fato de que, nessa configuração, tal liberdade restringe enormemente o direito do público à informação plural e de qualidade. Ou seja, produz o mesmo fenômeno que se aponta como exclusivo da Venezuela.
A respeito da não renovação da concessão da RCTV, o jornalista Ernesto Carmona, presidente do Colegio de Periodistas de Chile (Mencionado pelo colunista Jânio de Freitas, da Folha de S.Paulo), afirmou ter constatado, por meio de uma pesquisa, que
a não renovação da concessão a um meio de comunicação É COMUM em outros países.
Nos Estados Unidos, desde a fundação, em 1934, por Donald Rumsfeld, da FCC, o órgão controlador dos meios de comunicação do país, até o final dos anos 80, foram fechadas 141 emissoras de televisão, entre elas 100 que não foram renovadas, da mesma forma como ocorreu com a RCTV da Venezuela.
O governo americano revogou a concessão de 39 televisões antes mesmo do vencimento da licença. Não se tem notícia de que a decisão drástica dos Estados Unidos tenha gerado protestos da parte dos que hoje contestam a decisão da Suprema Corte da Venezuela, que respeitou rigorosamente o prazo da concessão da RCTV. Carmona afirma que em países como Peru, Canadá, Estados Unidos e Reino Unido houve revogação de licenças concedidas a diversas emissoras de televisão, sem qualquer repercussão internacional.
Os fatos mostram que, além e acima do amor à liberdade de expressão, propalado pelos donos da mídia, pesam os interesses dos seus negócios e da política nas emissoras de televisão. Não é uma exclusividade brasileira ou latino-americana. Como contrapartida de contribuições de campanha, as empresas de telecomunicações dos Estados Unidos obtiveram gratuitamente concessões para a TV digital no valor de US$ 70 bilhões. A informação é do escritor, comentarista de televisão e ex-assessor do presidente Richard Nixon, Kewin Phillips.
Há esboços de reações ao poder massacrante da grande mídia.
No México, a Suprema Corte anulou parte da lei de 2006 que regulamenta as concessões de televisão e rádio, apelidada de Lei Televisa, por favorecer a Televisa e também a Azteca, os dois grandes grupos que controlam a tevê no país.
No Uruguai, disposições legais recentes contemplam a televisão e a rádio comunitárias. Na Argentina, criou-se o canal público Encuentros.
No Brasil, os questionamentos ao sistema de concessões de emissoras, a discussão sobre a necessidade de controle público tanto das licenças como do conteúdo veiculado e o projeto do governo de se criar uma tevê pública representam uma reação ao marasmo reinante sobre o assunto até recentemente. Mas permanece pouco discutida a disputa de espaço entre as emissoras de televisão e as empresas de telefonia, assunto que envolve negócios bilionários e, ao mesmo tempo, repercutirá em um dos mais importantes direitos da sociedade: o de ser bem informada.
Carlos Drummond é jornalista. Coordena o Curso de Jornalismo da Facamp e é doutor em Economia pela Unicamp.
Não se trata propriamente de defender a “liberdade de expressão”, já que em muitos países ocorreram e ocorrem decisões de governo que tiram emissoras de TV do ar, sem nenhum protesto. Trata-se, na verdade, de criar um clima para que elas próprias privatizem as concessões, perpetuem-se no controle dos canais, por causa de seus bilionários negócios. Eles não querem pagar impostos, não querem regulamentações, não querem se submeter às leis.
SEGUE A ÍNTEGRA:
Fonte: Revista Terra Magazine do Portal Terra
http://terramagazine.terra.com.br/
TV do Brasil defende venezuelana para perpetuar-se
Carlos Drummond
As emissoras de televisão brasileiras estão aproveitando a “polêmica” em torno da não renovação da concessão da Radio Caracas Televisión - RCTV da Venezuela para criar um clima que inviabilize qualquer questionamento sobre as suas próprias permissões para operar. A idéia subjacente é PERPETUAR as suas licenças, por definição temporárias.
É mais um passo da privatização branca das concessões do Estado para a operação de emissoras, renováveis ou não a cada 15 anos no Brasil. A presença maciça de parlamentares proprietários de emissoras e o interesse generalizado dos políticos de não se indispor com a mídia têm garantido a renovação automática das permissões.
O poder de comunicação decorrente da propriedade de emissoras de televisão assegura a reeleição desses políticos em um esquema de blindagem das concessões que se realimenta a cada pleito.
Pelo menos tão grave e condenável quanto a homogeneização do conteúdo televisivo empreendida pelo governo da Venezuela é a não aceitação, lá e aqui, da decisão legal que impediu a RCTV de continuar no ar. A origem da inquietação dos barões da televisão brasileira é uma decisão legal do maior tribunal de um país estrangeiro.
A Suprema Corte da Venezuela determinou que, ao final do seu período de concessão de 20 anos, no último dia 28 de maio, a RCTV deveria sair do ar, por ter participado do golpe contra o presidente Hugo Chávez em 2002 e por demonstrar falta de respeito para com as autoridades e as instituições venezuelanas.
O ministro das Telecomunicações, Jessé Chacón, disse que se a emissora não saísse do ar, estaria operando na ilegalidade. A decisão formal da corte e a declaração oficial do ministério das Telecomunicações não impediram a RCTV de dizer que a decisão do governo venezuelano de não renovar a sua concessão foi ilegal.
No Brasil, o presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Daniel Slaviero, criticou, em discurso pronunciado no 24º Congresso Brasileiro de Radiodifusão, o fechamento da emissora venezuelana, classificando a decisão da justiça de lá como iniciativa isolada para restringir a liberdade de expressão.
Noticiou-se que Slaviero defendeu também a redução de impostos para a compra de equipamentos para a TV digital e pediu mais linhas de crédito, merecendo, compreensivelmente, aplausos intensos dos participantes do congresso.
O fato de que a liberdade de expressão mencionada é proporcional ao poder econômico e político do cidadão e, portanto, dominada, hoje, pelos donos dos grandes grupos privados de comunicação, passou ao largo das formulações do encontro. Assim como o fato de que, nessa configuração, tal liberdade restringe enormemente o direito do público à informação plural e de qualidade. Ou seja, produz o mesmo fenômeno que se aponta como exclusivo da Venezuela.
A respeito da não renovação da concessão da RCTV, o jornalista Ernesto Carmona, presidente do Colegio de Periodistas de Chile (Mencionado pelo colunista Jânio de Freitas, da Folha de S.Paulo), afirmou ter constatado, por meio de uma pesquisa, que
a não renovação da concessão a um meio de comunicação É COMUM em outros países.
Nos Estados Unidos, desde a fundação, em 1934, por Donald Rumsfeld, da FCC, o órgão controlador dos meios de comunicação do país, até o final dos anos 80, foram fechadas 141 emissoras de televisão, entre elas 100 que não foram renovadas, da mesma forma como ocorreu com a RCTV da Venezuela.
O governo americano revogou a concessão de 39 televisões antes mesmo do vencimento da licença. Não se tem notícia de que a decisão drástica dos Estados Unidos tenha gerado protestos da parte dos que hoje contestam a decisão da Suprema Corte da Venezuela, que respeitou rigorosamente o prazo da concessão da RCTV. Carmona afirma que em países como Peru, Canadá, Estados Unidos e Reino Unido houve revogação de licenças concedidas a diversas emissoras de televisão, sem qualquer repercussão internacional.
Os fatos mostram que, além e acima do amor à liberdade de expressão, propalado pelos donos da mídia, pesam os interesses dos seus negócios e da política nas emissoras de televisão. Não é uma exclusividade brasileira ou latino-americana. Como contrapartida de contribuições de campanha, as empresas de telecomunicações dos Estados Unidos obtiveram gratuitamente concessões para a TV digital no valor de US$ 70 bilhões. A informação é do escritor, comentarista de televisão e ex-assessor do presidente Richard Nixon, Kewin Phillips.
Há esboços de reações ao poder massacrante da grande mídia.
No México, a Suprema Corte anulou parte da lei de 2006 que regulamenta as concessões de televisão e rádio, apelidada de Lei Televisa, por favorecer a Televisa e também a Azteca, os dois grandes grupos que controlam a tevê no país.
No Uruguai, disposições legais recentes contemplam a televisão e a rádio comunitárias. Na Argentina, criou-se o canal público Encuentros.
No Brasil, os questionamentos ao sistema de concessões de emissoras, a discussão sobre a necessidade de controle público tanto das licenças como do conteúdo veiculado e o projeto do governo de se criar uma tevê pública representam uma reação ao marasmo reinante sobre o assunto até recentemente. Mas permanece pouco discutida a disputa de espaço entre as emissoras de televisão e as empresas de telefonia, assunto que envolve negócios bilionários e, ao mesmo tempo, repercutirá em um dos mais importantes direitos da sociedade: o de ser bem informada.
Carlos Drummond é jornalista. Coordena o Curso de Jornalismo da Facamp e é doutor em Economia pela Unicamp.