5 de dezembro de 2013
Comissão da Verdade, resgatando os subterrâneos da história
A Comissão Estadual da Verdade é um mecanismo oficial de
apuração de violações dos direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988, com
foco nos crimes cometidos durante a ditadura militar (1964-1985). Os integrantes
estão oficialmente investidos de poderes para identificar e reconhecer os fatos
e pessoas que cometeram violências, assim como as que sofreram violências. Compõem
a Comissão Estadual da Verdade na Bahia a educadora Amabília Almeida, Antônio
Walter Pinheiro (ABI), Carlos Navarro Filho, Dulce Tamara Lamego Silva Aquino,
Jackson Azevedo, Joviniano Soares Carvalho Neto (presidente) e Vera Christina
Leonelli. A comissão foi criada por decreto do governador Jaques Wagner em
dezembro de 2012.
Por que iniciar com o depoimento de dez pessoas? Porque eles
representam a “ponta do iceberg”, disse o presidente da Comissão da Verdade,
Joviniano Neto, na abertura da Audiência Pública realizada (03/12/2013) no
salão Nobre da Reitoria da UFBA.
Virgildásio Senna, ex-prefeito cassado em abril de 1964, não era
comunista, e foi deposto pelo arbítrio para bloquear o avanço da democracia;
Theodomiro Romeiro dos Santos e Olderico Barreto representam os baianos que
escolheram o caminho da luta armada, um direito dos povos oprimidos; Luiz
Contreiras, dirigente do PCB que não apoiava a luta armada e assim mesmo foi
preso, torturado; o artista plástico Juarez Paraíso representa a perseguição às
artes e à cultura; Wilton Valença e Marival Caldas são sindicalistas
petroleiros que defenderam a Petrobrás e os trabalhadores, pagando com prisão e
demissão do emprego; Emiliano José,
Mariluce Moura e Eliana Rolemberg são exemplos da juventude que arriscou a vida
na luta contra a ditadura.
Coube ao sociólogo Joviniano Neto entrevistar Virgildásio
Senna, lúcido, aos 90 anos, eleito duas vezes deputado federal após a
redemocratização. “O caminho é a democracia, precisamos de mais democracia,
pluralismo, porque o radicalismo é a chaga do processo político”. Ele lembrou
do cenário da Guerra Fria dos anos 1960, da radicalização dos comícios e do
advento do golpe militar. “o senhor está preso porque está preso” foi o
argumento do oficial do Exército que o prendeu no Quartel da Mouraria, quando
ele se apresentou. No episódio da cassação do mandato do prefeito, de 15 em 15
minutos os vereadores eram chamados ao Quartel. Foi processado pela Justiça
Militar com uma acusação ridícula de “vínculo com potências estrangeiras”.
Mesmo com um processo inepto, em 1968 foi cassado oficialmente pelo STM, com
perda dos direitos políticos por 18 anos.
Cassado, foi com a família para o Rio de Janeiro, recomeçar
a vida, com a conta bancária bloqueada pelos militares. Com a redemocratização
foi eleito deputado constituinte na Assembléia Nacional Constituinte de 1988. Em
seu depoimento disse esperar que, sem revanchismo, que a Comissão da Verdade
revele o que foi escondido pela malícia, violência, tortura e truculência que
passaram a dominar o Brasil. “Quem diz a verdade, manifesta a justiça” disse
Joviniano Neto citando o Velho Testamento.