1 de janeiro de 2013
Que tal começar 2013 pensando certo?
Ex-ministro de FHC, Luiz Carlos Bresser Pereira publicou duro
artigo sobre o comportamento das elites ao longo da Ação Penal 470. "O que
significou, afinal, esse julgamento? O início de uma nova era na luta contra a
corrupção no Brasil, como afirmaram com tanta ênfase elites conservadoras, ou,
antes, um momento em que essas elites lograram afinal impor uma derrota a um
partido político que vem governando o país há dez anos com êxito?"
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- A ação penal 470 foi um julgamento político. O momento em que as
elites brasileiras, após a rúína neoliberal, decidiram se apegar ao velho
moralismo liberal. A tese é do cientista político Luiz Carlos Bresser Pereira,
ex-ministro de FHC, que publicou artigo na Folha. Leia abaixo:
O
mensalão, as elites e o povo
Depois do fracasso da aventura neoliberal, as elites se prendem ao
velho moralismo liberal
O
fato político de 2012 foi o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do
processo do mensalão e a condenação a longos anos de prisão de três líderes do
Partido dos Trabalhadores com um currículo respeitável de contribuições ao
país.
O que
significou, afinal, esse julgamento? O início de uma nova era na luta contra a
corrupção no Brasil, como afirmaram com tanta ênfase elites conservadoras, ou,
antes, um momento em que essas elites lograram afinal impor uma derrota a um
partido político que vem governando o país há dez anos com êxito?
Havia
um fato inegável a alimentar o processo e suas consequências políticas. O malfeito,
a compra de deputados e o uso indevido do dinheiro público existiram. Mas
também é inegável que, em relação aos três principais líderes políticos
condenados, não havia provas suficientes -provas que o direito penal brasileiro
sempre exigiu para condenar. O STF foi obrigado a se valer de um princípio
jurídico novo, o domínio do fato, para chegar às suas conclusões.
Se,
de fato, o julgamento do mensalão representou grande avanço na luta pela
moralidade pública, como se afirma, isso significará que a Justiça brasileira
passará agora a condenar dirigentes políticos e empresariais cujos subordinados
ou gerentes tenham se envolvido em corrupção. Acontecerá isso? Não creio.
Como
explicar que esse julgamento tenha se constituído em um acontecimento midiático
que o privou da serenidade pública necessária à justiça? Por que transformou
seu relator em um possível candidato à Presidência (aquele, na oposição, com
maior intenções de votos segundo o Datafolha)? E por que, não obstante sua
repercussão pública, o Datafolha verificou que, se a eleição presidencial fosse
hoje, tanto Dilma Rousseff quanto o ex-presidente Lula se elegeriam no primeiro
turno?
Para
responder a essas perguntas é preciso considerar que elites e povo têm visão
diferente sobre a moralidade pública no capitalismo.
Enquanto
classes dominantes adotam uma permanente retórica moralizante, pobres ou menos
educados são mais realistas. Sabem que as sociedades modernas são dominadas
pela mercadoria e pelo dinheiro.
Ou,
em outras palavras, que o capitalismo é intrinsecamente uma forma de
organização econômica onde a corrupção está em toda parte. O Datafolha nos
ajuda novamente: para 76% dos brasileiros existe corrupção nas obras da Copa.
Hoje,
depois do fracasso da aventura neoliberal no mundo, as elites, inclusive a
classe média tradicional, estão desprovidas de qualquer projeto político digno
desse nome e se prendem ao velho moralismo liberal.
Já os
pobres, pragmáticos, votam em quem acreditam que defende seus interesses. Não
acreditam que elites e o país se moralizarão, mas, valendo-se da democracia
pela qual tanto lutaram, votam nos candidatos que lhes inspiram mais confiança.
Não
concluo que a luta contra a corrupção seja inglória. Ela é necessária, e
sabemos que quanto mais desenvolvido, igualitário e democrático for um país,
mais altos serão seus padrões morais. Terem havido condenações no julgamento do
mensalão representou avanço nessa direção, mas ele ficou prejudicado porque
faltou serenidade para identificar crimes e estabelecer penas.