5 de março de 2011

 

Nos carnavais de tuas ruas ouve-se nítido choro dos descaídos

Poema de Mário Oliveira (nascido em Santo Amaro da Purificação), da obra Tua Forma, enviado pelo cantor e compositor baiano Roberval Santos, em pleno Carnaval:

Ó Quão Dessemelhante

Filha múltipla dos fios
Que ergueram disforme.
Filha pútrida dos sentimentos regentes.
Se por tuas mornas águas palafitas
Banham-se estúpidos inocentes,
É pois, enfia-lhes então goela abaixo
Ambíguas e indignas vertentes.

Nos vértices do tabuleiro que
A velha ama-seca carrega,
Escondem-se vultos inanimados,
Traz em mãos calejadas,
A forma do ontem, do hoje, e do quando.

Disseram-me rica e gregoriana,
Austera e profana,
Plena e condoreira.
Mostrou-se estreita e fátidica,
Carlista e fascista,
Conjurada em poeira.

Nos carnavais de tuas ruas
Ouve-se nítido choro dos descaídos.
Entretanto...
Celebra-se tanto!
Canta-se tanto!
Fodem-se tanto!
Que por mais alto o pranto
Tem seu eco suprimido.

No que em mim difere o canto
Quebra-se completamente o encanto.
Minhas rugas! Minhas rusgas!
Traços que conduzem ao solo acinzentado
Que mesmo em barro é almoçado
Inchado por barriga infantil.

Extraio das minhas córneas
A cumplicidade que me exiges. E nego!
Deste meu corpo em cúmplice
Não verás uma só gota,
E num olhar mais que seco,
Desmantelador,
Findar-se-á o ciclo da dor
Que de há muito se anuncia,
Bahia, triste Bahia.

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