20 de novembro de 2007
Ex-ministro Nilmário Miranda escreve artigo no jornal O Tempo
O jornal mineiro O Tempo, publicou (17/11/07) o seguinte artigo de Nilmário Miranda, jornalista, ex-ministro dos Direitos Humanos, atual vice-presidente da Editora Perseu Abramo e presidente do PT de Minas Gerais. Ele acaba de lançar o livro "Teófilo Otoni, a República e a Utopia do Mucuri" pela Editora caros Amigos.
Teófilo Ottoni, a República e a utopia do Mucuri
Nilmário Miranda
Teófilo Benedito Ottoni tinha 15 anos quando foi proclamada a Independência do Brasil. Seu pai, Jorge Benedito, ardente patriota, creu ter chegado a hora dos brasileiros terem oportunidade do estudo e da ascensão social. Ledo engano. Quatro dos seus 11 filhos foram para o Rio de Janeiro estudar na Academia da Marinha em 1826. "Os filhos dos grandes, inda que idiotas, tinham o direito de assentar praça de guarda-marinha e os descendentes de quatro avós nobres a de aspirantes. Isto, antes mesmo de se matricularem na Academia", escreveu Ottoni.
Mente brilhante, foi o primeiro aluno em todas as matérias e derrotou os privilégios, recebendo a graduação em guarda-marinha, fato sem precedente. Pelo resto de sua vida defendeu e se pautou por valores republicanos como merecimento, igualdade, utilidade, a virtude entendida como dedicação à causa pública em oposição ao sistema de privilégios, vantagens, títulos de nobreza, comendas, a diferenciação pelo sangue e origem familiar das castas nobiliárquicas.
Além de sólida formação técnica, Ottoni aprendeu rebeldia política, bebendo os ensinamentos de Thomas Jefferson, dos enciclopedistas e dos clássicos. Foi precursor dos direitos humanos ao reconhecer a humanidade dos escravos e dos índios botocudos do Mucuri, ao se opor aos horrores das prisões arbitrárias e defender a presunção da inocência na vigência do despotismo, defensor intransigente da liberdade de imprensa e do alargamento das liberdades individuais e coletivas em plenos anos absolutistas. Adepto e praticante da tolerância, do civilismo, da compaixão, não hesitou em passar da arma da crítica à crítica das armas, exercendo o direito de resistência à tirania, baseado em são Thomaz e na revolução americana.
Derrotado em Santa Luzia em 1842, escolheu ser preso ao invés de fugir para discutir suas razões nos tribunais. Após um ano e meio de prisão em Ouro Preto, fez sua própria defesa em Mariana, foi absolvido e depois anistiado. Frustrado com o encolhimento do espaço público pelos tentáculos do leviatã imperial, Ottoni foi embriagado por um projeto grandioso.
No sertão inóspito das brenhas do Vale do Mucuri, implantar um projeto farol, como um falanstério republicano. Através da Companhia de Comércio e Navegação do rio Mucuri, construiu uma estrada de rodagem de 180 km, estradas articuladas com navegação fluvial e cidades: Jacuri, Capelinha e Filadélfia (esta última, desde 1878 recebeu o nome de Teófilo Ottoni). Uma cidade cosmopolita que acolhia índios, negros, brasileiros, alemães, chineses, franceses, portugueses, belgas, suíços; homens livres com direito à propriedade. Em tempo recorde brotam ali oficinas, armazéns, serrarias, quartéis, escolas, igrejas católica e luterana.
Em contraposição à sociedade imperial e sua corte cheia de parasitas, conservadora, autoritária, defendia a livre circulação de homens, produtos e idéias. Queria libertar sua terra natal, a comarca do Serro (área que contemplava Minas Novas, Diamantina e todo o Norte mineiro), do isolamento. Uma carga que levava 80 dias pela Estrada Real chegará em 30 dias e uma carta que antes demorava 31 dias para chegar ao destino passa a levar 12 dias. Temerosos da força política e moral que adviria dali, a Companhia do Mucuri é encampada.
Ottoni, arruinado fisicamente pela malária contraída nos pântanos do Mucuri, empobrecido e tolhido pela incompreensão, encontra forças para voltar à vida política. Sua famosa "Circular aos Eleitores Mineiros" incendeia o imaginário e ele lidera uma maré democrática a partir de 1860, colocando em xeque o Poder Moderador, a censura e o sistema eleitoral corrompido. Torna-se o político mais popular do país.
Foi vereador, deputado provincial, deputado geral e senador. Incorruptível, manteve-se fiel aos princípios. Como disse Heloísa Starling: "Narrar a aventura política de Teófilo Ottoni é um gesto de luta contra o tempo, um modo de convocar para algo que ainda não aconteceu, algo que permanece como esperança".
No dia 27 de novembro completam- se 200 anos de nascimento de Teófilo Benedito Ottoni no Serro. É uma nova data que merece ser tornada célebre (celebrada), trazida à memória (comemorada) e chamada de volta ao coração (recordada).
Teófilo Ottoni, a República e a utopia do Mucuri
Nilmário Miranda
Teófilo Benedito Ottoni tinha 15 anos quando foi proclamada a Independência do Brasil. Seu pai, Jorge Benedito, ardente patriota, creu ter chegado a hora dos brasileiros terem oportunidade do estudo e da ascensão social. Ledo engano. Quatro dos seus 11 filhos foram para o Rio de Janeiro estudar na Academia da Marinha em 1826. "Os filhos dos grandes, inda que idiotas, tinham o direito de assentar praça de guarda-marinha e os descendentes de quatro avós nobres a de aspirantes. Isto, antes mesmo de se matricularem na Academia", escreveu Ottoni.
Mente brilhante, foi o primeiro aluno em todas as matérias e derrotou os privilégios, recebendo a graduação em guarda-marinha, fato sem precedente. Pelo resto de sua vida defendeu e se pautou por valores republicanos como merecimento, igualdade, utilidade, a virtude entendida como dedicação à causa pública em oposição ao sistema de privilégios, vantagens, títulos de nobreza, comendas, a diferenciação pelo sangue e origem familiar das castas nobiliárquicas.
Além de sólida formação técnica, Ottoni aprendeu rebeldia política, bebendo os ensinamentos de Thomas Jefferson, dos enciclopedistas e dos clássicos. Foi precursor dos direitos humanos ao reconhecer a humanidade dos escravos e dos índios botocudos do Mucuri, ao se opor aos horrores das prisões arbitrárias e defender a presunção da inocência na vigência do despotismo, defensor intransigente da liberdade de imprensa e do alargamento das liberdades individuais e coletivas em plenos anos absolutistas. Adepto e praticante da tolerância, do civilismo, da compaixão, não hesitou em passar da arma da crítica à crítica das armas, exercendo o direito de resistência à tirania, baseado em são Thomaz e na revolução americana.
Derrotado em Santa Luzia em 1842, escolheu ser preso ao invés de fugir para discutir suas razões nos tribunais. Após um ano e meio de prisão em Ouro Preto, fez sua própria defesa em Mariana, foi absolvido e depois anistiado. Frustrado com o encolhimento do espaço público pelos tentáculos do leviatã imperial, Ottoni foi embriagado por um projeto grandioso.
No sertão inóspito das brenhas do Vale do Mucuri, implantar um projeto farol, como um falanstério republicano. Através da Companhia de Comércio e Navegação do rio Mucuri, construiu uma estrada de rodagem de 180 km, estradas articuladas com navegação fluvial e cidades: Jacuri, Capelinha e Filadélfia (esta última, desde 1878 recebeu o nome de Teófilo Ottoni). Uma cidade cosmopolita que acolhia índios, negros, brasileiros, alemães, chineses, franceses, portugueses, belgas, suíços; homens livres com direito à propriedade. Em tempo recorde brotam ali oficinas, armazéns, serrarias, quartéis, escolas, igrejas católica e luterana.
Em contraposição à sociedade imperial e sua corte cheia de parasitas, conservadora, autoritária, defendia a livre circulação de homens, produtos e idéias. Queria libertar sua terra natal, a comarca do Serro (área que contemplava Minas Novas, Diamantina e todo o Norte mineiro), do isolamento. Uma carga que levava 80 dias pela Estrada Real chegará em 30 dias e uma carta que antes demorava 31 dias para chegar ao destino passa a levar 12 dias. Temerosos da força política e moral que adviria dali, a Companhia do Mucuri é encampada.
Ottoni, arruinado fisicamente pela malária contraída nos pântanos do Mucuri, empobrecido e tolhido pela incompreensão, encontra forças para voltar à vida política. Sua famosa "Circular aos Eleitores Mineiros" incendeia o imaginário e ele lidera uma maré democrática a partir de 1860, colocando em xeque o Poder Moderador, a censura e o sistema eleitoral corrompido. Torna-se o político mais popular do país.
Foi vereador, deputado provincial, deputado geral e senador. Incorruptível, manteve-se fiel aos princípios. Como disse Heloísa Starling: "Narrar a aventura política de Teófilo Ottoni é um gesto de luta contra o tempo, um modo de convocar para algo que ainda não aconteceu, algo que permanece como esperança".
No dia 27 de novembro completam- se 200 anos de nascimento de Teófilo Benedito Ottoni no Serro. É uma nova data que merece ser tornada célebre (celebrada), trazida à memória (comemorada) e chamada de volta ao coração (recordada).