23 de setembro de 2007
Mais da metade da população está fora da seguridade social
Uma análise consistente sobre a Pesquisa Nacional por Amostragem em Domicílios – PNAD foi escrita pelo ex-ministro José Dirceu e publicada no Jornal do Brasil (20/09/07). Os dados da pesquisa refletem a melhoria no desempenho econômico e os ganhos obtidos pelas políticas públicas. Mas, há um porém. A PNAD revela que mais da metade da população está fora da rede de proteção da seguridade social. Isso assusta. Um grande desafio do Governo Lula é consolidar a Previdência sem cortar gastos. É a receita neoliberal. Isso só interessa à direita, aos ricos. Retirar direitos, não.
LEIA ARTIGO DE JOSÉ DIRCEU:
Pnad: os excluídos da seguridade social
José Dirceu
Os dados da Pesquisa Nacional por Amostragem em Domicílios (Pnad), relativos a 2006, refletem não só a melhoria do desempenho econômico do país mas os ganhos decorrentes de políticas públicas consistentes, como os avanços obtidos em vários níveis da educação, inclusive com a ampliação do ensino universitário - especialmente por meio das vagas abertas pelo ProUni, programa de bolsa de estudo para jovens de baixa renda. Graças à política de recomposição do salário mínimo, os trabalhadores que ganham menos recuperaram, no ano passado, o rendimento que tinham 10 anos atrás.
Se a evolução de indicadores como emprego e renda, educação, entre outros, merece comemoração, há ainda problemas relevantes a serem superados.
Um que se destaca é a baixa cobertura da rede de proteção social. A pesquisa feita pelo IBGE mostra que, entre 2005 e 2006, houve crescimento de 2,4% no número de pessoas ocupadas, índice pouco inferior ao registrado no ano anterior (2,7%).
No entanto, houve aceleração dos empregos com carteira assinada: de cada cinco vagas abertas em 2006, três eram com carteira. Como conseqüência, aumentou o número de contribuintes para a Previdência, que não cobre, no entanto, nem a metade da população ocupada.
Ou seja, segundo a PNAD 2006, 51,2% da população ocupada estava fora da rede de proteção da seguridade social do Brasil. O percentual assusta e mostra a urgência de uma política pública para incluir na Previdência os excluídos, que são os que têm relações precárias no trabalho formal e os que vivem do trabalho informal.
Esse é um dos grandes desafios para o segundo governo do presidente Lula e deve ser questão prioritária para o Fórum Nacional da Previdência Social, em desenvolvimento este ano.
A agenda do Fórum, que vai apresentar ao Congresso Nacional, em 2008, propostas para a política da Previdência, não pode ficar circunscrita ao estreito debate de cortar ou não cortar as despesas correntes da Previdência. Essa é a pauta que interessa aos conservadores, para os quais a única forma de enfrentar o aumento das despesas correntes da Previdência em relação ao PIB (passaram de 2,5% para 7%, de 1988 para 2006) é cortar gastos. De imediato, com a desvinculação dos benefícios da Previdência do reajuste do salário mínimo, o que considero inadmissível; e, no médio prazo, com a mudança na combinação da idade mínima de aposentadoria com o tempo mínimo de contribuição.
Sou absolutamente contra qualquer alteração de regra para os trabalhadores que já estão no mercado de trabalho. Mas reconheço que, em função das esperadas alterações no perfil demográfico da população em 30 ou 40 anos, é necessário que se discuta mudanças nas condições de aposentadoria para os que vão ingressar nos próximos anos no mercado de trabalho.
A proposta simplista de cortar despesas segue o batido receituário neoliberal, que naufragou em outros países latino-americanos. E peca por ignorar a possibilidade de ampliar a base de arrecadação e por não apostar em um crescimento sustentável do país. Não fosse o crescimento médio pífio dos últimos 15 anos, a relação entre despesas previdenciárias e PIB seria outra.
Também será outra, se ampliarmos a base de arrecadação. Um dos caminhos é a mudança de aplicação do fator previdenciário. Em vez de a cobrança da contribuição ser feita sobre a folha de pagamento, que onera os maiores empregadores de mão-de-obra, ela passaria a ser feita sobre o faturamento da empresa. Essa mudança permitiria, segundo especialistas, jogar na formalidade, em curto espaço de tempo, pelo menos um terço dos trabalhadores informais.
A dimensão dos excluídos da rede de proteção social - o maior índice de exclusão social revelado pela PNAD em relação a direitos essenciais da cidadania - mostra que o país não pode mais perder tempo, protelando medidas importantes. É hora de o governo e a sociedade enfrentarem o desafio da universalização da seguridade social.
José Dirceu é ex-ministro chefe da Casa Civil.
Artigo publicado originalmente no Jornal do Brasil de 20/09/2007.
LEIA ARTIGO DE JOSÉ DIRCEU:
Pnad: os excluídos da seguridade social
José Dirceu
Os dados da Pesquisa Nacional por Amostragem em Domicílios (Pnad), relativos a 2006, refletem não só a melhoria do desempenho econômico do país mas os ganhos decorrentes de políticas públicas consistentes, como os avanços obtidos em vários níveis da educação, inclusive com a ampliação do ensino universitário - especialmente por meio das vagas abertas pelo ProUni, programa de bolsa de estudo para jovens de baixa renda. Graças à política de recomposição do salário mínimo, os trabalhadores que ganham menos recuperaram, no ano passado, o rendimento que tinham 10 anos atrás.
Se a evolução de indicadores como emprego e renda, educação, entre outros, merece comemoração, há ainda problemas relevantes a serem superados.
Um que se destaca é a baixa cobertura da rede de proteção social. A pesquisa feita pelo IBGE mostra que, entre 2005 e 2006, houve crescimento de 2,4% no número de pessoas ocupadas, índice pouco inferior ao registrado no ano anterior (2,7%).
No entanto, houve aceleração dos empregos com carteira assinada: de cada cinco vagas abertas em 2006, três eram com carteira. Como conseqüência, aumentou o número de contribuintes para a Previdência, que não cobre, no entanto, nem a metade da população ocupada.
Ou seja, segundo a PNAD 2006, 51,2% da população ocupada estava fora da rede de proteção da seguridade social do Brasil. O percentual assusta e mostra a urgência de uma política pública para incluir na Previdência os excluídos, que são os que têm relações precárias no trabalho formal e os que vivem do trabalho informal.
Esse é um dos grandes desafios para o segundo governo do presidente Lula e deve ser questão prioritária para o Fórum Nacional da Previdência Social, em desenvolvimento este ano.
A agenda do Fórum, que vai apresentar ao Congresso Nacional, em 2008, propostas para a política da Previdência, não pode ficar circunscrita ao estreito debate de cortar ou não cortar as despesas correntes da Previdência. Essa é a pauta que interessa aos conservadores, para os quais a única forma de enfrentar o aumento das despesas correntes da Previdência em relação ao PIB (passaram de 2,5% para 7%, de 1988 para 2006) é cortar gastos. De imediato, com a desvinculação dos benefícios da Previdência do reajuste do salário mínimo, o que considero inadmissível; e, no médio prazo, com a mudança na combinação da idade mínima de aposentadoria com o tempo mínimo de contribuição.
Sou absolutamente contra qualquer alteração de regra para os trabalhadores que já estão no mercado de trabalho. Mas reconheço que, em função das esperadas alterações no perfil demográfico da população em 30 ou 40 anos, é necessário que se discuta mudanças nas condições de aposentadoria para os que vão ingressar nos próximos anos no mercado de trabalho.
A proposta simplista de cortar despesas segue o batido receituário neoliberal, que naufragou em outros países latino-americanos. E peca por ignorar a possibilidade de ampliar a base de arrecadação e por não apostar em um crescimento sustentável do país. Não fosse o crescimento médio pífio dos últimos 15 anos, a relação entre despesas previdenciárias e PIB seria outra.
Também será outra, se ampliarmos a base de arrecadação. Um dos caminhos é a mudança de aplicação do fator previdenciário. Em vez de a cobrança da contribuição ser feita sobre a folha de pagamento, que onera os maiores empregadores de mão-de-obra, ela passaria a ser feita sobre o faturamento da empresa. Essa mudança permitiria, segundo especialistas, jogar na formalidade, em curto espaço de tempo, pelo menos um terço dos trabalhadores informais.
A dimensão dos excluídos da rede de proteção social - o maior índice de exclusão social revelado pela PNAD em relação a direitos essenciais da cidadania - mostra que o país não pode mais perder tempo, protelando medidas importantes. É hora de o governo e a sociedade enfrentarem o desafio da universalização da seguridade social.
José Dirceu é ex-ministro chefe da Casa Civil.
Artigo publicado originalmente no Jornal do Brasil de 20/09/2007.